quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Os Primeiros Termoscópios

Alexandre Medeiros (PhD, University of Leeds – Professor de Física e Astronomia, UFRPE)

Tópicos História da Física

Os Primeiros Termoscópios

A invenção do termômetro é algo polêmico. Não se sabe, ao certo, qual a primeira pessoa que teria inventado esse instrumento tão importante para o estudo dos fenômenos relacionados ao calor. Existem divergências entre os historiadores da ciência sobre a justeza de conceder legitimidade a um relato histórico por vezes escassamente documentado. Isso tem levado alguns historiadores a não creditarem a primazia de uma descoberta ou de uma invenção a um determinado indivíduo sem claros e confiáveis registros escritos. Observaremos tal polêmica no relato histórico que se segue.
Para além, no entanto, desta questão de confiabilidade das fontes históricas, existe ainda algo igualmente importante envolvido nesse debate. O que está em jogo numa tal disputa é algo mais complexo que simplesmente procurar o primeiro indivíduo que tenha construído um instrumento que se assemelhe ao nosso termômetro atual. A questão envolve a nossa própria conceituação do que possa, ou não, ser tido como um termômetro. Além disso, a própria idéia de invenção requer uma intencionalidade da parte do inventor, no nosso caso uma intencionalidade em construir um instrumento para medir, ou ao menos avaliar, temperaturas, que precisa ser cuidadosamente analisada.

Algumas informações históricas sobre os primeiros termômetros são um tanto imprecisas. Robert Fludd (1574-1637), alquimista inglês, por exemplo, fez referência, em sua obra Philosophia Moysaica a um certo instrumento, que poderia ter servido para medir temperaturas e que, segundo ele, havia visto descrito em um manuscrito, já então, com mais de quinhentos anos.
É certo, que já na Antiguidade grega, Philo de Bizâncio, por volta do século I AC e Heron de Alexandria, no século I da nossa era, haviam construído curiosos instrumentos, baseados na dilatação do ar, que poderiam ter sido os primeiros instrumentos destinados a avaliar, ou mesmo medir, os aquecimentos.


O aparelho de Philo era constituído simplesmente de um tubo de vidro em U com um dos seus ramos penetrando até o fundo de uma esfera oca de chumbo. O outro ramo do tubo era mergulhado num vaso com água. Vedando-se o encaixe do tubo com a esfera e aquecendo-se a mesma, surgiam bolhas de ar no vaso com água.
Na verdade, o ar aprisionado na esfera dilatava-se escapando como bolhas através do vaso com água. O tubo ao ser posteriormente resfriado causava a contração do ar fazendo com que a água do vaso subisse pelo tubo. Era um aparelho muito interessante, cujo funcionamento dependia essencialmente das variações de temperatura.
 Observar um tal instrumento com o nosso conhecimento atual pode levar-nos a imaginar que, sem dúvida, as variações dos níveis da água poderiam ter sido utilizadas como uma forma de medir a temperatura. Embora esta possibilidade pudesse efetivamente ter sido desenvolvida, isso, no entanto, jamais ocorreu a Philo ou a qualquer outro filósofo grego da Antiguidade. Há várias razões para isso. Em primeiro lugar, a preocupação dos gregos era, aparentemente, com os efeitos misteriosos produzidos pelo instrumento, não lhes tendo ocorrido, jamais, a idéia de associar tais efeitos como uma forma de medir a temperatura.
Heron chegou a desenvolver uma grande variedade de instrumentos, principalmente fontes, cujos misteriosos funcionamentos envolviam, certamente, noções intuitivas de hidrostática e de dilatação dos fluidos. Tais instrumentos, porém, foram utilizados principalmente para a produção de efeitos ilusórios, aparentemente mágicos, nos templos do Deus Serápis. Serápis era um novo Deus, inventado pelos conquistadores gregos de Alexandria, em substituição aos velhos deuses Egípcios e posteriormente identificado pelos dominadores romanos com Zeus, o Deus dos deuses. Os efeitos ilusórios produzidos pelos instrumentos, aparentemente inocentes, de Heron, que ainda hoje nos causam admiração, devem ter desempenhado um papel importante para a classe dominante romana de Alexandria.
Quando olhamos atentamente certos dispositivos da antiga Alexandria, como as variadas fontes e principalmente a aeolipila de Heron, (figura ao lado), espécie de turbina a vapor primitiva em forma de esfera oca com saídas laterais que girava rapidamente com a dilatação da água nela contida, damo-nos conta de quão próximos estiveram os antigos gregos, do ponto de vista técnico, da invenção da máquina a vapor e portanto do desenvolvimento de uma ciência do calor.
Numa sociedade escravista, porém, como a da antiga Alexandria, na qual a mão de obra era farta e barata, não parece ter ocorrido a nenhum filósofo a idéia de utilizar aqueles instrumentos para substituir o trabalho humano. A função da ciência, segundo as expectativas da classe dominante, não poderia mesmo ir além da produção de mágicas e efeitos ilusórios.
O desenvolvimento da máquina a vapor e de uma decorrente ciência do calor tiveram de esperar quase dois mil anos até que se produzissem condições sociais nas quais novos problemas viessem a dar um novo impulso ao desenvolvimento científico. O final da Idade Média coincidiu com uma época na qual  as grandes navegações , a invenção das armas de fogo e a difusão dos livros impressos trouxeram uma grande modificação na mentalidade européia. Problemas como o esgotamento das minas, a previsão do tempo, o controle da febre trazida pelas novas doenças, a expansão dos gases dentro das armas de fogo e principalmente o posterior desenvolvimento da produção nas fábricas, fazem parte de um conjunto complexo de influências sócio-econômicas que pavimentaram o novo caminho que a ciência viria a trilhar. O século XVII, caracterizado pela Revolução Científica, foi, neste contexto, o cenário inicial de transformações mais profundas que viriam a ocorrer no século seguinte com a Revolução Industrial. De modo análogo, o desenvolvimento da termometria no século XVII e início do século XVIII, constituiu-se na ante-sala do desenvolvimento da calorimetria no século XVIII e da termodinâmica no século XIX.
Retomemos, portanto, a problemática de como os antigos instrumentos de Philo e de Heron poderiam ser interpretados em épocas distintas. Não tendo sido utilizados com a finalidade específica de medir, ou ao menos avaliar, temperaturas, aqueles aparelhos não podem ser tidos como verdadeiros termômetros, mas apenas como precursores e inspiradores dos mesmos.
Uma invenção não ocorre necessariamente quando um novo instrumento é construído, mas quando uma nova possibilidade do mesmo, é explorada. É o tipo de uso que se faz de um certo instrumento que caracteriza, ou não, a presença de um elemento novo e criativo. Neste sentido, os antigos instrumentos gregos, construídos por Philo e Heron, não podem ser tidos como legítimos aparelhos de medida, pois lhes faltou a intenção de utilizarem tais dispositivos  para avaliarem as temperaturas. A simples idéia de que uma temperatura pudesse ao menos vir a ser medida era algo totalmente estranho à Antiguidade e à Idade Média. É inegável, no entanto, o papel exercido por tais instrumentos gregos como fontes inspiradoras para novas formas de uso nos séculos XVII e XVIII. Neste sentido, por exemplo, a célebre obra de Heron Os Pneumáticos, que foi traduzida e publicada em latim em 1575 e em italiano em 1589, viria a constituir-se num ponto de partida para os novos estudos e descobertas sobre o calor e a temperatura no século XVII.
Normalmente, entende-se como descoberta o encontro de um fato novo. No entanto, a idéia relacionada a este fato é que constitui, na realidade, a verdadeira descoberta. Toda iniciativa experimental inclui necessariamente uma idéia. É precisamente esta idéia que dá origem à experiência e confere significado à mesma. Deste modo, uma descoberta não é feita necessariamente quando um novo fato é encontrado, mas, sobretudo, quando fatos já conhecidos são vistos de uma maneira totalmente nova.
Foi dentro dessa perspectiva de descoberta que se deu a releitura e as novas interpretações de antigos conhecimentos gregos e que teve início a moderna história da termometria.
Levando-se em conta o caráter da experiência ser carregada de uma reflexão teórica, poderíamos questionar a quem teria ocorrido, primeiramente, a utilização de um instrumento com o propósito deliberado de medir temperaturas. Vários indivíduos têm sido apontados como responsáveis por este salto conceitual, dentre eles Galileu Galilei (1564-1642), Francis Bacon (1561-1626), Sanctorius Sanctorius (1561-1636), Robert Fludd (1574-1637), Jan Baptista van Helmont (1577-1644) e Cornelius Van Drebbel (1572-1634).

Provavelmente, no início do século XVII, os primeiros instrumentos concebidos para medirem a temperatura surgiram mais ou menos simultaneamente e em locais variados.
Este é um exemplo, dentre vários outros que podem ser encontrados na história da ciência, de descobertas simultâneas. Uma certa temática, ligada muitas vezes a uma determinada expectativa social, aparece em certas ocasiões como um verdadeiro problema de pesquisa. Esta temática, transformada, então, em um problema a ser resolvido, é atacada simultaneamente por várias pessoas, em vários locais, muitas vezes isoladamente umas das outras. Nestas circunstâncias, os tipos de abordagens adotados, e não exatamente a primazia cronológica das descobertas, é que se constituem em objetos de estudo historicamente mais relevantes.
De um modo geral, aqueles primeiros instrumentos eram todos imprecisos, sujeitos às influências da pressão atmosférica, servindo mais para indicar variações de temperatura que marcações precisas da mesma. Apenas a partir de 1617 é que tais instrumentos passaram a ter a denominação específica de termoscópios. A denominação de termômetros, que viria a tornar-se dominante, é um pouco posterior, tendo sido utilizada pela primeira vez apenas em 1624 pelo matemático francês Jean Leurechon (1593-1670), em sua obra intitulada La Récréation Mathématique, na qual introduziu o vocábulo francês termomètre.

Ainda assim, dada a imprecisão daqueles primeiros instrumentos, a denominação mais propícia, segundo nosso conhecimento atual, teria sido, apesar de não ter sido utilizada àquela época, a de termobaroscópios, para assinalar a influência da pressão atmosférica, até então desconhecida. Apesar da denominação de termômetro ter vindo a tornar-se de uso indiscriminado na segunda metade do século XVII, o primeiro instrumento que viria realmente a merecer tal denominação, segundo a nossa compreensão atual da necessidade de conter uma escala precisa, viria a ser construído apenas em 1714, por Daniel Fahrenheit, como veremos mais detalhadamente na sequência deste texto.
Note-se que a influência da pressão atmosférica nas marcações dos primeiros termoscópios era algo impossível de ser observado no início do século XVII, pois o próprio conceito de pressão atmosférica ainda não existia.


A ideia revolucionária de que a atmosfera exerce uma pressão sobre os corpos nela imersos só viria a ser introduzida na física por Evangelista Torricelli em 1643, como uma tentativa arrojada de compreender e solucionar o problema do limite da altura alcançada pela coluna de água nas bombas de sucção utilizadas nas fontes.
Esta questão da pressão atmosférica serve igualmente para ilustrar o quanto as observações são carregadas de teoria.
Durante quase dois séculos, do final do século XVI até meados do século XVIII, os estudos sobre o calor e a temperatura, e mais especificamente sobre os problemas da medida da temperatura, estiveram diretamente relacionados às questões da saúde e do clima. Não é, portanto, surpreendente que tais estudos, tenham sido conduzidos inicialmente por indivíduos ligados à prática da medicina ou da meteorologia. As idéias de temperatura e calor ainda não estavam, à época, bem distintas uma da outra, fato que, como já assinalamos, só viria a ter início com os trabalhos de Joseph Black, na metade do século XVIII e que marca o início de um novo ramo da física, a Calorimetria, cujo estudo pormenorizado está fora do escopo deste presente trabalho. Cabe salientar, entretanto, que até meados do século XVIII, ainda sob a influência remanescente do pensamento aristotélico, muitos referiam-se, de forma não diferenciada, a graus de calor, temperamento do calor ou temperatura. A medida da temperatura era vista, deste modo, como dando conta de tudo o que poderia ser medido nos fenômenos térmicos.
Só com os trabalhos de Black é que a temperatura começaria a ser vista como a  intensidade do calor, para diferenciá-la  da quantidade de calor. Foi a possibilidade de medir quantidades de calor, vislumbrada por Black, por volta de 1754, como algo bem diferente das medições de temperatura, que levou à invenção de um  novo instrumento, o calorímetro, e deste modo à invenção da nova ciência da Calorimetria. Para que isso, no entanto, viesse a ocorrer em meados do século XVIII, foi preciso que antes termômetros mais precisos viessem a estar disponíveis, o que nos remete a retomar o curso do seu desenvolvimento histórico.
Possivelmente, o primeiro instrumento científico construído especificamente para medir temperaturas foi inventado por Galileu, por volta de 1592, logo após a tradução, para o italiano, dos trabalhos de Heron. Galileu não parece, no entanto, ter atribuído ao seu instrumento o merecido valor, pois não são conhecidas afirmações escritas, do próprio Galileu, dando conta da construção do instrumento. A invenção do termoscópio foi creditada a Galileu principalmente pelos seus discípulos, pois seus próprios escritos contêm apenas uma única referência ao princípio desse instrumento.  Embora Sagredo, numa carta ao seu amigo Galileu,  datada de 1615, tenha atribuído ao mesmo a invenção do termômetro, o próprio Galileu afirmava apenas ter melhorado uma forma primitiva desse instrumento.  Tal afirmação parece confirmar a influência grega acima mencionada. Em apenas uma ocasião Galileu fez referência escrita ao uso do instrumento, sem reivindicar, entretanto, a autoria do mesmo.
A versão da invenção do termoscópio, por Galileu, em 1592, pertence a Viviani (1622-1703), outro de seus discípulos e primeiro biógrafo do grande mestre italiano. Por outro lado, a célebre descrição do termoscópio dada por Castelli (1578-1643) está contida numa carta que este discípulo de Galileu escreveu a Cesarini em 1638 na qual afirmava ter visto seu mestre usar o instrumento nas suas aulas em 1603.



Segundo Castelli, "Galileu tomou um vaso de vidro aproximadamente do tamanho de um ovo de galinha e ajustou-o a um tubo da largura de um canudo com cerca de 18 polegadas de comprimento; ele aqueceu o bulbo de vidro em suas mãos e inverteu o tubo mergulhando-o num outro vaso com água. Tão logo o vaso resfriou-se a água subiu no tubo até a altura de 9 polegadas acima do nível do segundo vaso. Ele usou este instrumento para investigar os graus de calor e frio”. Note-se que os deslocamentos da coluna líquida eram causados, no termoscópio de Galileu, não pela dilatação do líquido, mas pela dilatação do ar contido na ampola de vidro.
Deste modo, o ar era a verdadeira substância indicadora da temperatura, ou substância termométrica, como denominamos atualmente, e a dilatação do ar servia como propriedade indicadora da temperatura, ou propriedade termométrica.
Esta contribuição conceitual era de grande importância, mas Galileu não apenas não deu grande valor ao seu instrumento como não parece, sobretudo, ter tido a clareza do salto genial que havia dado ao usar tal instrumento para medir temperaturas. Apesar disso, a genialidade de Galileu está em ter interpretado, intencionalmente, as alturas da coluna líquida como possíveis medidas das temperaturas que a elas pareciam associadas. Assumiu Galileu, portanto, o pressuposto de que a cada valor de temperatura corresponderia um e apenas um comprimento da coluna de água.
Esta ideia brilhante não era de todo verdadeira, no caso do seu instrumento, pois sendo o mesmo aberto, as variações da pressão atmosférica faziam com que para uma mesma temperatura fosse possível, em diferentes ocasiões, observarem-se diferentes alturas da coluna líquida. Galileu não parece ter-se dado conta deste detalhe, apontado posteriormente por Robert Boyle após os trabalhos de Torricelli, Pascal e Guericke sobre a pressão atmosférica. De todo modo, esse seria um problema que viria a ser superado, de formas variadas, ao longo dos desenvolvimentos posteriores da termometria.
Mesmo desconhecendo a falha do seu instrumento, e conseqüentemente sua possível solução, Galileu assumiu a conjectura arrojada de que haveria uma e apenas uma altura da coluna de água para cada valor de temperatura. Tal conjectura, que hoje pode parecer simples à primeira vista, corresponde, na verdade, a um enorme salto conceitual. Ela equivale ao reconhecimento tácito de que a temperatura é um tipo de propriedade da natureza diferente, por exemplo, do comprimento.
Tomemos um exemplo para esclarecer a questão. Suponhamos que temos dois bastões de madeira, um  com dois metros de comprimento e o outro com três. Se colocarmos um no prolongamento do outro, poderemos formar um novo bastão de cinco metros, ou seja, o novo comprimento será o resultado da adição das extensões anteriores. O mesmo dá-se com a massa. Se colocarmos cem gramas de água numa panela e em seguida mais duzentos gramas, teremos no total trezentos gramas de água na panela. Esse caráter aditivo faz com que possamos medir os valores de tais grandezas por comparação direta com um valor padrão daquela mesma grandeza.
Podemos, deste modo, imaginar um comprimento de cinco metros como resultado da adição de cinco comprimentos de um metro, o mesmo raciocínio valendo para a massa.  Isso pode, atualmente, parecer-nos óbvio, pois estamos tão acostumados com esses fatos, que a familiaridade faz com que não reflitamos sobre eles. Tomamos como naturais idéias que nos vêm apenas da tradição de pensar de um certo modo. Mas será que todas as grandezas físicas podem ser medidas do mesmo modo que massas e comprimentos, ou seja, por comparação direta com um valor padrão? Em outras palavras, será que todas as grandezas físicas, podem ter esse caráter aditivo de seus valores, característico dos comprimentos, das extensões?
Vejamos um outro exemplo. Se colocarmos um copo com água a 10oC numa panela e logo após outro copo d'água, também a 10oC, será que teremos como resultado que a água da panela atingirá os 20o? A experiência mostra-nos que não. Ou seja, a temperatura não é uma grandeza do mesmo tipo que o comprimento ou a massa. Ela não possui esse caráter aditivo direto, característico das massas e dos comprimentos. Assim sendo, as medições de temperatura não podem ser feitas por comparações diretas, como no caso das extensões.
Daí a importância de enfatizarmos a interpretação da temperatura como algo semelhante a uma intensidade de calor, diferentemente da conceituação mais antiga de simples graus de calor, que não fazia distinção entre calor e temperatura. Tal conceituação, no entanto, como dissemos anteriormente, viria a ser construída apenas nos tempos de Black, mais de cento e cinqüenta anos após a invenção de Galileu.
Ainda, no entanto, que esse caráter intensivo da temperatura só tenha vindo a ser revelado explicitamente por  Black, ele já estava contido de forma implícita e embrionária na intenção de Galileu de medir as temperaturas de uma forma indireta, fazendo recurso ao tipo de associação acima discutido: para cada valor de comprimento da coluna líquida do termoscópio deveria existir, a princípio,  um e apenas um valor da temperatura.

Galileu não parece, porém, ter estado em alerta para a utilidade da marcação de temperaturas de referência na calibração do seu instrumento. Desta maneira, não introduziu nenhuma verdadeira escala, contentando-se em subdividir aleatoriamente o comprimento do tubo em divisões do mesmo tamanho. Com efeito, Galileu parece ter adicionado ao seu termoscópio, uma escala que consistia apenas de uma longa tira de papel fixada ao tubo de vidro e marcada arbitrariamente com oito longos espaços, cada um dos quais, divididos em sessenta intervalos menores, ou graus. Uma tal escala, parece inspirada nas graduações adotadas em instrumentos astronômicos em graus e minutos.
A falta de testemunhos escritos mais pormenorizados tem levado alguns historiadores a creditarem a outros, e não apenas a Galileu, a invenção do primeiro termoscópio. Cornelius van Drebbel (1572-1634), por exemplo, tem sido por vezes mencionado como tendo construído, em 1621, um termoscópio no qual a dilatação de uma certa massa de ar elevava uma coluna de água. Semelhante ao instrumento de Galileu, este também dava indicações errôneas devido às variações da pressão atmosférica. Drebbel, um construtor de instrumentos holandês, fixado na Inglaterra, ficou mais conhecido, no entanto, pela invenção do primeiro protótipo de um submarino, que navegou pelo rio Tamisa, em Londres, em 1624.
Jan Baptista van Helmont (1579-1644), médico e alquimista flamengo, mais ou menos à mesma época, utilizou, também termoscópios para medir a temperatura dos corpos. Analogamente, Francis Bacon (1561-1626), já em 1620, descreveu um instrumento muito parecido, tendo igualmente uma tira de papel fixada ao tubo de vidro contendo uma escala com as mesmas limitações daquela utilizada por Galileu.

Próximo texto deste série: O Termômetro Clínico de Sanctorius.


 
PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. Os Primeiros Termoscópios. BLOG Física e Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG.














Nenhum comentário:

Postar um comentário