segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A Física das Cores Fortes e das Cores Esmaecidas e a Percepção de Profundidade

SÉRIE DE TEXTOS: A FÍSICA NO DIA A DIA
AUTOR: Alexandre Medeiros
TÓPICO: TONALIDADES DAS CORES E PERCEPÇÃO DA PROFUNDIDADE
TÍTULO DO ARTIGO: A Física das cores fortes e das cores esmaecidas e a percepção de profundidade

Por que em muitas pinturas, as tonalidades mais claras são usadas para representar cenas mais distantes?
Por que se costuma usar tonalidades claras para decorar apartamentos pequenos?

Esta representação é o fundamento de um tipo especial de perspectiva baseado no esmaecimento das cores com o aumento da distância do objeto observado ao observador, e é mais conhecida entre os artistas como perspectiva atmosférica.
Assim como a tradicional perspectiva geométrica, o seu fundamento científico pode também ser encontrado no estudo do cone ótico de visada de um objeto.
A perspectiva, ou seja, a técnica de comunicar a ilusão de tridimensionalidade com uma figura em duas dimensões, não se dá apenas através de sua representação geométrica mais conhecida, ou seja, aquela na qual o ângulo de visada determina que os objetos mais distantes sejam representados em duas dimensões em uma escala menor.
É possível, também, utilizar um conveniente jogo de esmaecimento de cores para produzir efeitos semelhantes de perspectiva. Mas, como isso ocorre e qual o seu fundamento físico?
Isso se deve ao fato de que a intensidade do iluminamento de uma superfície varia com o inverso do quadrado da distância da mesma à fonte de luz.

É esse fato da luz ficar cada vez mais espalhada pelo cone ótico à medida que a distância ao observador aumenta que faz com que quanto mais um objeto esteja afastado deste observador, mais a luz que provém do mesmo lhe pareça mais atenuada e as suas cores lhes pareçam crescentemente mais esmaecidas. Ou seja, pelo fato da energia luminosa ir se distribuindo por uma área cada vez maior, as tonalidades das cores nos parecem cada vez mais claras à medida que um objeto visualizado se afasta de nós e o contraste do mesmo torna-se cada vez mais difuso.

Assim, tonalidades de cores mais esmaecidas dão ao observador uma maior sensação de profundidade. Este fato é largamente aproveitado na decoração de ambientes, fazendo com que, por exemplo, cômodos pequenos sejam decorados com tonalidades de cores mais claras.

Não apenas a atenuação da tonalidade da cor pode dar uma maior sensação de profundidade; a própria cor que venha ser utilizada pode também contribuir para acentuar ou para reduzir este mesmo efeito visual de profundidade.
Este segundo fator de acentuação ou de atenuação da profundidade de um ambiente, decorrente do tipo de cor utilizada, entretanto, não se deve à lei do inverso do quadrado da distância relativa à dispersão da luz pelo cone ótico. Ele decorre de outro fenômeno (a ser analisado em uma questão específica em outro texto desta mesma série de Física no Dia a Dia) e ao qual associamos dois novos conceitos: temperatura das cores e progressividade das cores.

PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. A Física das cores fortes e das cores esmaecidas e a percepção de profundidade. Física e Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG. http://alexandremedeirosfisicaastronomia.blogspot.com/2011/11/fisica-das-cores-fortes-e-das-cores.html . Acessado em 28 de Novembro de 2011. (atualizar a data)


domingo, 27 de novembro de 2011

Área e Pressão Hidrostática em Tubos de Creme Dental

Alexandre Medeiros (PhD, University of Leeds – Professor de Física e Astronomia, UFRPE)

SÉRIE DE TEXTOS: A FÍSICA NO DIA A DIA
AUTOR: Alexandre Medeiros
TÓPICO: ÁREA E PRESSÃO HIDROSTÁTICA

TÍTULO DO ARTIGO: Área e Pressão Hidrostática em Tubos de Creme Dental
Ao apertarmos em excesso um tubo de creme dental, frequentemente sai mais creme do que queríamos. Qual a explicação física para o fato de que podemos fazer este excesso de creme ser novamente sugado pelo tubo ao apertarmos o mesmo pelas suas faces mais estreitas?
A resposta reside na compreensão da relação existente entre a área da superfície comprimida e a pressão resultante. Ao apertarmos o tubo faz toda diferença se apertamos nas faces largas ou nas estreitas. Ao apertarmos o tubo, o que estamos fazendo é empurrar para dentro uma parte da face comprimida. Mas, a depender da área da mesma (larga ou estreita), o comportamento pode ser bem diferente.
Ao apertarmos as áreas mais largas, nós as empurramos para dentro. Isso aumenta a pressão no interior do tubo e, em consequência, a pasta é empurrada para fora do mesmo.
Note, ainda, que as outras duas faces mais estreitas do tubo pulam para fora e isso contribui para diminuir a pressão no interior seu interior.

Na comparação do aumento x diminuição da pressão dentro do tubo, o maior é aumento, pois nós apertamos as suas faces mais largas. Foram elas que entraram ligeiramente no espaço interior do tubo e empurram, em decorrência, a pasta para fora.
Imagine, agora, que apertamos o mesmo tubo pelas duas outras faces mais estreitas. O que ocorre?
Elas entram e isso, certamente contribui também para aumentar a pressão no interior do tubo.

E, por que, então, a pasta não sai, neste caso? Por que ela entra em vez de sair?
Porque, simultaneamente, as duas outras faces do tubo (neste caso, agora, as duas faces mais largas), são empurradas para fora. Isso faz com que a pressão interna tenda a diminuir, pois o deslocamento das faces mais largas para fora abre um espaço vazio no interior do tubo maior do que a redução de espaço provocada pela entrada das faces mais estreitas no mesmo.
Neste caso, o balanço do aumento x redução da pressão é vencido pela redução da pressão, ocasionada pelo afastamento das duas faces mais largas do tubo. Assim sendo, a variação de pressão causada pelo deslocamento dessas faces mais largas é novamente a vencedora. Só que, agora, este deslocamento contribui para uma redução da pressão no interior do tubo.
É por causa desta redução da pressão interna resultante que a pasta de dente é empurrada, pela pressão atmosférica, de volta para dentro do tubo.
Este fenômeno pode ser usado com certa imaginação para transformar o popular brinquedo denominado ”Mergulhador de Descartes” (ou Ludião) em um “Elevador de Descartes”. Para isso basta utilizar um recipiente com faces laterais de áreas diferentes como os vasos de algumas marcas de shampoo, como a da figura abaixo. Evidentemente garrafas PET cilíndricas não produzem este curioso efeito de inversão do “mergulhador” para “elevador”.



PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. Área e Pressão Hidrostática em Tubos de Creme Dental. Física e Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG.

Terremotos e Ondas Sísmicas Transversais, Longitudinais e Complexas

Alexandre Medeiros (PhD, University of Leeds – Professor de Física e Astronomia, UFRPE)

SÉRIE DE TEXTOS: A FÍSICA NO DIA A DIA
AUTOR: Alexandre Medeiros
TÓPICO: ONDAS LONGITUDINAIS, TRANSVERSAIS e COMPLEXAS
TÍTULO DO ARTIGO: Terremotos e Ondas Sísmicas Transversais, Longitudinais e Complexas

Como se origina um terremoto em uma região próxima de uma falha geológica? Como se consegue determinar a posição do ponto onde ele teve origem e quais as características das ondas sísmicas formadas neste evento?
Um terremoto gerado em um local próximo de uma falha geológica é quase sempre provocado principalmente por tensões de cisalhamento; ou seja, o terremoto é produzido quando camadas rochosas superpostas deslizam uma sobre a outra de forma análoga ao que ocorre na figura abaixo (esquerda) entre as duas placas rebitadas.
Uma tensão de cisalhamento é criada quando as forças que agem sobre um corpo, atuam na mesma direção, mas em sentidos opostos. Um exemplo típico de tensão de cisalhamento é aquela que acontece em uma tesoura.

Não podendo, a princípio, se movimentar, devido a algum impedimento, como um possível engate de gigantescas rochas subterrâneas, as placas ficam sujeitas à referida tensão de cisalhamento e o sistema vai, assim, acumulando energia potencial até o limite de resistência da referida rocha.  Ao ser finalmente liberada como energia cinética, ela pode provocar um súbito deslizamento das placas rochosas da crosta terrestre ao longo de toda a falha geológica.  Os efeitos deste tipo de ocorrência em terremotos são mostrados na figura seguinte da direita.

A fonte desta ruptura da rocha e do consequente deslizamento está localizada em um ponto subterrâneo denominado de hipocentro ou foco do terremoto.
A projeção vertical deste foco na superfície terrestre determina a posição do epicentro do terremoto. O epicentro, portanto, não é a origem do terremoto, mas sim a projeção vertical dessa origem.
De um modo geral, as ondas geradas em um terremoto podem ser de dois tipos: as ondas de corpo (ou de volume) e as ondas superficiais.
As ondas de corpo são geradas no foco do terremoto e se propagam através da massa do planeta, enquanto que as ondas superficiais se propagam através da superfície da Terra e são originadas a partir do momento que as ondas de corpo atingem a superfície. Elas se propagam radialmente, mas suas trajetórias mudam de direção ao sofrerem os efeitos da refração provocados pelas alterações de densidade e de composição do interior da Terra.
As ondas de corpo podem ser subdividas em dois tipos: as ondas primárias (ou ondas P), e as ondas secundárias (as ondas S). As ondas P são ondas longitudinais de compressões e expansões, com amplitudes e períodos pequenos, e fazem as rochas vibrarem na mesma direção de propagação da onda. Elas alteram o volume das rochas atingidas, mas não as suas formas, como evidenciado nas duas figuras abaixo.
Semelhantes às ondas sonoras, as ondas P se propagam com velocidades que variam de acordo com o meio que atravessam: aproximadamente 3300 m/s no ar, 1450 m/s na água e 5000 m/s no granito. Elas são menos destrutivas que as ondas de corpo secundárias e muito menos ainda que as posteriores ondas de superfície.

Apesar de se originarem simultaneamente, as ondas primárias e as ondas secundárias se propagam com diferentes velocidades.
As ondas primárias recebem este nome justamente porque se propagam mais rapidamente e assim sendo, chegam primeiro em todos os pontos da superfície da Terra.
As ondas secundárias, cujas velocidades são da ordem de 60% da velocidade das ondas P em um mesmo material, chegam um pouco depois. Esta diferença de tempo de chegada, aliada ao conhecimento das referidas velocidades das duas ondas, serve para que se determine a distância do foco do terremoto até um local qualquer da superfície da Terra.

Por outro lado, as ondas secundárias (ou ondas S), são ondas transversais ou de cisalhamento, ou seja, elas fazem as partículas do meio através do quais se propagam vibrarem em uma direção perpendicular à direção de propagação da própria onda.

Diferentemente das ondas P, as ondas S causam mudanças na forma dos materiais atingidos, sem, contudo alterarem os seu volume se movem apenas através de materiais sólidos, dado que líquidos e gases (por não terem forma definida) não sofrem tensão de cisalhamento.
As ondas S, além disso, atingem amplitudes muito maiores que as das ondas P (de compressão e expansão) e com isso são bem mais destrutivas que aquelas.
Por outro lado, as ondas superficiais são formadas a partir do epicentro, desde o momento em que as primeiras ondas de corpo atingem o solo. Elas, entretanto, continuam sendo formadas a partir de todos os outros pontos seguintes da superfície desde cada momento de chegada em tais pontos das ondas de corpo. Daí porque as ondas superficiais são em verdade muito mais complexas do que as ondas de corpo, visto que elas são em verdade o resultado de um processo extremamente complexo de múltiplas e sucessivas superposições de ondas. De um modo geral, as ondas de superfície têm uma velocidade menor que a das ondas de corpo e, portanto, chegam com certo atraso em relação àquelas em todos os locais atingidos pelo terremoto. Além disso, elas têm baixas frequências, mas amplitudes muito elevadas. Esta alta amplitude, aliada ao fato de serem propagadoras de vibrações bastante complexas, fazem com que elas submetam os materiais através dos quais se propagam, a enormes esforços, sendo, portanto, altamente destrutivas. Essas ondas superficiais podem também ser subdividas em dois outros tipos: as ondas de Rayleigh e as ondas de Love. Esses nomes foram dados em homenagem aos dois cientistas ingleses que as descreveram pioneiramente: Lord Rayleigh (John William Strutt) (1885) e Augustus Edward Hough Love (1911).
As ondas de Rayleigh se assemelham às ondas que se propagam na superfície da água e são elas o resultado da interferência de ondas primárias e secundárias ao atingirem a superfície terrestre. Devido á essa origem, as ondas de Rayleigh apresentam uma mescla das características das ondas longitudinais com as ondas transversais. A direção de propagação dessas ondas é perpendicular à oscilação média do meio; entretanto, este meio apresenta também um movimento de vai e vem análogo ao das ondas longitudinais e que resulta em um rolamento deste mesmo meio, como mostram as figuras abaixo.
As ondas superficiais de Love, por outro lado, são o resultado de tensões de cisalhamento horizontal do solo provocadas pela interferência de duas ondas de corpo secundárias e são um pouco mais rápidas que as ondas de Rayleigh.
Observando-se as figuras abaixo, pode-se perceber que os esforços provocados pelas ondas Love tendem alternadamente a distender e a comprimir o meio através do qual se propagam tanto para cima e para baixo, quanto lateralmente, exercendo um efeito de cisalhamento altamente destrutivo e dilacerador nos materiais atingidos pelas mesmas. As ondas Love são, por isso, o tipo mais destrutivo de ondas sísmicas produzidas durante um terremoto.

É ilustrativo visualizar lado a lado esses dois tipos de ondas complexas: Rayleigh e Love, como mostra a figura abaixo, dado que as diferenças entre elas são mais sutis. Embora sejam praticamente desconhecidas pelo público leigo, elas são as principais responsáveis pelos danos causados em terremotos, principalmente as terríveis ondas Love.


PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. Terremotos e Ondas Sísmicas Transversais, Longitudinais e Complexas. Física e Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG.


sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Proteção Acústica Grega contra Solapadores de Muralhas

Alexandre Medeiros (PhD, University of Leeds – Professor de Física e Astronomia, UFRPE)

SÉRIE DE TEXTOS: A FÍSICA NO DIA A DIA
AUTOR: Alexandre Medeiros
TÓPICO: RESSONÂNCIA
TÍTULO DO ARTIGO: Proteção Acústica Grega contra Solapadores de Muralhas

Como os antigos gregos conseguiam descobrir os locais dos túneis subterrâneos que estavam sendo construídos pelos inimigos romanos sob suas muralhas?


Se os romanos criaram a técnica dos solapadores (escavadores de túneis para a destruição de muralhas), os gregos criaram uma técnica contrária para descobrirem o local preciso de tais túneis. Eles faziam pequenos buracos nas paredes das suas muralhas e neles fincavam bastões horizontais. A outra extremidade dos bastões era apoiada na parte convexa de seus escudos metálicos. Assim, a concavidade dos escudos ficava voltada para o interior da fortaleza.


Tais escudos eram dispostos a cada metro e meio de distância ao longo da muralha. O ruído provocado pela escavação de um túnel subterrâneo fazia com que os escudos dispostos na muralha e mais próximos do mesmo vibrassem em ressonância com os ruidos da escavação. Deste modo, a intensidade do som era amplificada pelo formato côncavo dos referidos escudos e a vibração detectada denunciava o local da escavação invasora.
Orifícios estreitos eram então escavados verticalmente pelos defensores gregos em busca dos tais túneis inimigos. Através de desses orifícios era então bombeada uma fumaça tóxica com o auxílio de foles.
A fumaça era produzida pela queima de penas de aves misturadas com plantas venenosas e enxofre produzindo amônia e outros gases tóxicos que asfixiavam os escavadores dos túneis.

PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. Proteção Acústica Grega contra Solapadores de Muralhas. Física e Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG.

A Física das Falhas Geológicas e dos Terremotos

Alexandre Medeiros (PhD, University of Leeds – Professor de Física e Astronomia, UFRPE)

SÉRIE DE TEXTOS: A FÍSICA NO DIA A DIA
AUTOR: Alexandre Medeiros
TÓPICO: ONDAS CIRCULARES E ONDAS PLANAS
TÍTULO DO ARTIGO: A Física das Falhas Geológicas e dos Terremotos 
Em um grande terremoto provocado pelo movimento da crosta terrestre ao longo de uma falha geológica que se estende por centenas de quilômetros, qual a diferença em termos de possíveis danos, entre dois locais situados a diferentes distâncias da referida falha?

Os possíveis danos a serem causados pelo terremoto em algum tipo de estrutura, como uma casa, por exemplo, dependerão em grande medida do tipo dessas estruturas e do tipo de solo através do qual ela se propaga. Portanto, seria mais apropriado falarmos apenas da energia que devido ao terremoto pode atingir locais situados a diferentes distâncias da referida falha geológica, desprezando-se as possíveis características distintas dos solos.
Consideremos, como exemplo, a falha de San Andreas, na Califórnia, conforme mostrada em uma vista aérea na figura abaixo.  No caso da ocorrência de um grande terremoto ao longo desta imensa falha, qual a diferença entre as quantidades de energia que devem atingir pontos como A e B na referida figura, situados a diferentes distâncias da referida falha?


Embora os pontos A e B, considerados na foto aérea, estejam situados respectivamente a aproximadamente 2 km e 6 km da falha de San Andreas; a energia sísmica que pode chegar aos mesmos, devido a um terremoto ao longo da referida falha, é praticamente a mesma.
Mas, por que isso ocorre? Afinal, as ondas não vão se abrindo à proporção em que se afastam da falha? E, deste modo, os pontos mais distantes não receberiam uma menor quantidade de energia por unidade de área?
É aqui que reside a importância da distinção entre ondas circulares e ondas planas. Analisemos, inicialmente, o caso de uma propagação de ondas circulares, como na figura abaixo, originadas em um determinado ponto.


Neste caso, tratam-se das ondas formadas pela queda de uma gota na água; mas, elas são do mesmo tipo daquelas formadas, por exemplo, pela queda de um meteorito na Terra.
Em casos como este, a energia da onda propaga-se circularmente e vai se atenuando com o quadrado da distância em relação ao ponto de impacto e assim sendo, a energia que atinge o ponto B é bem menor que aquela que atinge o ponto A da figura ao lado.
Entretanto, este não é o caso de um terremoto originado pelo deslocamento da crosta terrestre ao longo de uma falha geológica. Um terremoto ao longo de uma falha geológica não se assemelha ao sismo provocado pela queda de um meteorito; o que ocasiona o surgimento de ondas circulares.
No caso do movimento da crista ao longo de uma falha, as ondas geradas são semelhantes àquelas provocadas pela queda de um tronco pesado na água, como ilustrado nas figuras abaixo. São ondas planas, cuja propagação ao largo da falha não vai se abrindo rapidamente, como no caso das ondas circulares.
Assim, a dissipação da energia, neste caso, é consideravelmente menor. Por isso, pontos situados a diferentes distâncias da falha (mas, não muito distantes da mesma) recebem praticamente a mesma quantidade de energia por unidade de área.

Entretanto, para pontos muito afastados da referida falha geológica, ela se comporta como se fosse um ponto e neste caso, à proporção que nos distanciamos da mesma, o efeito destrutivo causado pelo terremoto vai realmente diminuindo, conforme ilustrado na figura abaixo.



PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. A Física das Falhas Geológicas e dos Terremotos. Física e Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG.
http://alexandremedeirosfisicaastronomia.blogspot.com/2011/11/fisica-das-falhas-geologicas-e-dos.html. Acessado em 25 de Novembro de 2011. (atualizar a data)

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Por que as Galinhas atravessam as Estradas?



Por que as galinhas atravessam as estradas?
Platão: Não sei se as galinhas atravessam as estradas. Isso parece ser apenas uma ilusão dos nossos sentidos.
Aristóteles: É da Natureza das galinhas atravessarem as estradas. O outro lado da estrada é o seu lugar natural.
Zenão de Eleia: As galinhas fazem isso apenas para mostrar que não conseguem chegar do outro lado da estrada.
Pitágoras: As galinhas atravessam as estradas para manter a harmonia entre elas.
Arquimedes: A galinha estava mergulhada na água quando de repente sentiu um empuxo para cima que a fez sair correndo e atravessar a estrada gritando Eureka.
Copérnico: Apesar das evidências dos sentidos eu posso mostrar que é matemáticamente mais simples admitir que a estrada atravessa as galinhas.
Galileo: As galinhas atravessam as estradas porque elas geralmente são inclinadas e também para observarem melhor as estrelas do outro lado.
Kepler: Na verdade as galinhas atravessam a estrada em uma trajetória que é um arco de elipse.
Newton: Galinhas em repouso tendem a permanecer em repouso, galinhas em movimento tendem a atravessar estradas.
Boyle: As galinhas estavam submetidas a uma grande pressão em casa e por isso atravessam as estradas.
Volta: É a diferença de potencial entre os dois lados que faz as galinhas atravessarem a estrada.
Watt: Ao atravessarem as estradas as galinhas estão apenas reduzindo a sua potência motriz.
Doppler: As galinhas atravessam as estradas devido ao efeito exercido pelas pessoas que se afastam ou que se aproximam das mesmas.
Ampere: As galinhas atravessam as estradas em disparada para se manterem correntes
Gauss: As galinhas atravessam as estradas devido à personalidade magnética do galo que está do outro lado da mesma.
Ohm: É preciso levar em conta que a estrada oferece uma certa resistência para que as galinhas a atravessem.
Lenz: Eu creio que há uma força de oposição crescente exercida sobre as galinhas à medida que elas tentam atravessar a estrada.
Graham Bell: As galinhas atravessam as estradas para chegarem ao telefone mais próximo
Thomas Edison: As galinhas atravessam as estradas porque acham esta ser uma experiência iluminadora.
Foulcault: Isso é apenas uma ilusão. Na verdade é a rotação da Terra que faz parecer as galinhas atravessarem as estradas.
Hertz: Tudo que se pode afirmar é que antes as galinhas atravessavam as estradas com uma maior frequência.
Marie Curie: As galinhas estavam radiantes de entusiasmo e por isso atravessaram a estrada.
Planck: Na verdade, as galinhas não atravessam a estrada de forma contínua, mas aos saltos.
Einstein: Se a galinha atravessa a estrada ou a estrada atravessa a galinha, isso depende do seu referencial.
Heisenberg: Nós não podemos saber ao certo de que lado da estrada a galinha se encontra, mas apenas que ela está atravessando a estrada muito depressa. Como ela atravessar a grande velocidade você pode observar a galinha ou medi-la, mas não pode fazer as duas coisas simultaneamente.
Pauli: De fato, já existia uma galinha de cada lado da estrada. E essas duas galinhas se diferenciam apenas pela maneira como giram em torno de si mesmas.
Steven Weinberg: Isso se deve ao fato de que as coisas aconteceram de tal modo nos três primeiros minutos do Universo que ficou determinado que as galinhas atravesassem as estradas.
Stephen Hawking: Na verdade existem muitos Universos paralelos nos quais a mesma galinha está em diferentes estágios atravessar a estrada. Apenas uma dessas galinhas atravessa completamente a estrada quando a sua função de onda coalesce.

A Internet apresenta  diferentes versões para esta “profunda questão filosófica”. Selecionei as melhores respostas e acrescentei algumas outras de minha própria autoria.

sábado, 19 de novembro de 2011

As Leis de Newton e a Mutação da Crosta Terrestre

Alexandre Medeiros (PhD, University of Leeds – Professor de Física e Astronomia, UFRPE)

SÉRIE DE TEXTOS: A FÍSICA NO DIA A DIA
AUTOR: Alexandre Medeiros
TÓPICO: LEIS DE NEWTON
TÍTULO DO ARTIGO: As Leis de Newton e a Mutação da Crosta Terrestre

Se todas as montanhas sofrem erosão, por que ainda existem montanhas na superfície da Terra?
De fato, se a completa erosão das montanhas leva algumas centenas de milhões de anos, então todas as montanhas, que eventualmente existiam quando a Terra foi formada há 4,5 bilhões de anos atrás, já deveriam ter sido completamente erodidas e assim sendo, a superfície do planeta deveria ser praticamente polida, sem qualquer tipo de característica física.
Erosão é a retirada de fragmentos das partes mais altas de um terreno e a sua condução para as partes mais baixas do mesmo. A erosão é causada pela atuação das águas e dos ventos e pelas mudanças de temperatura que decompõem e desagregam as rochas.

O impacto das chuvas (figura logo abaixo) e do vento (figuras mais abaixo), por exemplo, desagrega as partículas do solo que vão sendo então extraídas e transportadas para os rios, lagos, vales e oceanos.


Com o passar do tempo, a erosão faz com que as montanhas antes pontiagudas fiquem paulatinamente arredondadas e tendam a serem desgastadas até se tornarem planícies.
Entretanto, apesar dessa erosão, as montanhas ainda existem, apesar de que o nosso planeta já tem 4,5 bilhões de anos. Isso nos leva à conclusão de que novas montanhas têm que ser continuamente formadas para substituírem aquelas que vão sendo erodidas.

Mas, de acordo com as leis de Newton nenhuma mudança pode acontecer sem que aja a atuação de uma força que cause tal mudança. Deste modo, forças colossais devem estar agindo para formar novas montanhas.
Isso, entretanto, nos leva à conjecturar que forças seriam essas capazes de criar novas cadeias de montanhas e qual seria a origem das mesmas.
As evidências coletadas, e comentadas em outras questões neste BLOG apontam para a existência de aproximadamente treze gigantescas placas rochosas constituintes da crosta terrestre (as placas tectônicas) que estão em constante movimento flutuando sobre uma camada interior de rocha líquida, o magma.


É justamente o movimento ascensional deste mesmo magma o que causa o surgimento de novas montanhas.

PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. As Leis de Newton e a Mutação da Crosta Terrestre. Física e Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG.


Escala Geológica de Tempo e Erosão das Montanhas

Alexandre Medeiros (PhD, University of Leeds – Professor de Física e Astronomia, UFRPE)

SÉRIE DE TEXTOS: A FÍSICA NO DIA A DIA
AUTOR: Alexandre Medeiros
TÓPICO: ESCALAS DE TEMPO – ESCALA GEOLÓGICA
TÍTULO DO ARTIGO: Escala geológica de tempo e erosão das montanhas

Como sabemos que a superfície da Terra está mudando se frequentemente não observamos mudanças dramáticas na paisagem?

Na verdade, nenhuma característica da superfície terrestre (nem desertos, nem planícies, nem montanhas, nem oceanos) é permanente. Todas as características da paisagem estão em uma constante mudança, evoluindo para alguma coisa diferente. Entretanto, as mudanças mais extraordinárias são aquelas que nós não percebemos facilmente na escala de tempo da experiência humana. Não percebemos à primeira vista que os continentes estão em movimento, nem também que as montanhas estão em constante evolução.
Podemos, porém, fazer uma simples estimativa das mudanças da superfície terrestre baseando-nos em observações que nos são familiares, como por exemplo, nas corredeiras de água encontradas frequentemente nas montanhas.
As montanhas parecem ser, à primeira vista, ótimos exemplos de permanência na superfície terrestre. Entretanto, é fácil mostrar que elas estão em constante mutação.
Tomemos, por exemplo, o morro do Corcovado no Rio de Janeiro que domina a paisagem carioca. Ele tem uma altura de 710 metros acima do nível do mar.


Consideremos uma montanha ainda maior, como por exemplo, o monte do Pico, em Portugal, com seus 2.210 metros de altura acima do nível do mar. Ele é pouco mais de três vezes mais alto que o Corcovado.


Imaginemos, agora, uma montanha de forma simplificada como um paralelepípedo que tivesse praticamente esta mesma altura (2.000 metros), mas largura e profundidade iguais a 4.000 metros.
O volume desta montanha hipotética é:
Volume = altura x largura x profundidade = 2 km x 4 km x 4 km = 32 km3 = 3,2 x 1010 m3
Esta enorme montanha pode parecer, em um primeiro momento, um bom exemplo de imutabilidade; mas, pense um pouco nas corredeiras que se pode observar frequente nas encostas das montanhas.

Pode-se observar que essas corredeiras têm uma base arenosa, pois a água ao escorrer montanha abaixo carrega consigo uma certa quantidade de areia e pedregulhos. Isso é o resultado da erosão das rochas causada pela água que desce da montanha.
Deste modo, a própria existência da corredeira implica em que a montanha esteja sendo constantemente erodida pela água corrente.
Suponha, agora, que quatro corredeiras descem desta grande montanha e que cada corredeira carrega em média um décimo de metro cúbico de areia por dia. Isto não é, na verdade, uma grande quantidade de material. Ela corresponde a uma simples pilha de areia com 50 cm de altura e com 40 cm de largura e outros 40 cm de profundidade. Uma pilha destas caberia, por exemplo, folgadamente embaixo de uma cadeira normal.
Em um período de tempo de um ano, essas quatro corredeiras carregam um volume total de areia igual a:
Volume = 4 x 0,1 m3/dia x 365 dias = 146 m3/ano
Portanto, se a cada ano a referida montanha perde em média uma quantidade de aproximadamente 150 m3 de areia, ela não pode ter uma duração maior do que o seu volume total dividido pelo volume de areia erodido a cada ano.
Deste modo, a “vida útilda referida montanha seria:
Ou seja, mesmo uma montanha dessas prporções gigantescas duraria em média uns 213 milhões de anos; algo bem menor que a idade da Terra, que é da ordem de 4,5 bilhões de anos. Na verdade, a duração média de uma montanha como esta seria quase 25 vezes menor que a idade do planeta.


PARA CITAR ESTA FONTE: Medeiros, Alexandre. Escala geológica de tempo e erosão das montanhas. Física e Astronomia_Alexandre Medeiros, BLOG. http://alexandremedeirosfisicaastronomia.blogspot.com/2011/11/escala-geologica-de-tempo-e-erosao-das.html. Acessado em 19 de Novembro de 2011. (atualizar a data)

ALGUMAS TENDÊNCIAS NA UTILIZAÇÃO DE RECONSTRUÇÕES EXPERIMENTAIS HISTÓRICAS NO ENSINO DA FÍSICA

Durante mais de dez anos eu lecionei a disciplina Intrumentação para o Ensino da Física em paralelo com História da Física Clássica. Neste longo período tive a oportunidade de realizar, em conjunto com vários estudantes e alguns colegas, diversas reconstruções históricas de alguns experimentos célebres na Física. Embora eu não tenha a ilusão da existência de experimentos cruciais, ainda assim credito um grande valor pedagógico a essas aludidas reconstruções experimentais.
Penso em escrever algum dia um relato detalhado dessas coisas, mas enquanto isso divulgo abaixo um trabalho que escrevemos (eu e um então colega de departamento) sobre o referido assunto e que foi apresentado em um Congresso de História da Ciência em 2001.



ALGUMAS TENDÊNCIAS NA UTILIZAÇÃO DE RECONSTRUÇÕES EXPERIMENTAIS HISTÓRICAS NO ENSINO DA FÍSICA
VIII SEMINÁRIO DE HISTÓRIA DA CIÊNCIA (SBHC) – MUSEU DE ASTRONOMIA – RIO DE JANEIRO – 2001

Alexandre Medeiros   Departamento de Física (Universidade Federal Rural de Pernambuco)
Francisco Nairon Monteiro Jr   Departamento de Física (Universidade Federal Rural de Pernambuco)

Vários trabalhos têm sido dedicados à análise da importância da utilização da História da Ciência no ensino das ciências. Variando desde os aspectos ligados à motivação dos estudantes até a possibilidade de ser usada como uma ferramenta para a discussão da natureza da Ciência, a utilização da História tem sido defendida sob diferentes pontos de vista. No tocante às formas a serem adotadas, as opções têm sido também numerosas, desde apresentações biográficas, passando por estudos de caso temáticos, até o recurso de técnicas de teatralização. Em um ponto, porém, todas essas tendências parecem convergir: um destaque quase exclusivo aos aspectos teóricos e conceituais da produção científica. Mais recentemente, entretanto, tem nascido a convicção de que a história dos instrumentos científicos e dos experimentos executados com os mesmos, merece uma atenção semelhante àquela até então dedicada apenas aos aspectos teóricos. Assim sendo, iniciativas de reconstruções históricas de experimentos têm também ocupado um papel de destaque, nos últimos tempos, entre os trabalhos de pesquisa que tentam utilizar a história da ciência enquanto um poderoso recurso pedagógico.
O presente trabalho faz uma análise das duas principais tendências de pesquisa existentes nesta área das reconstruções históricas, apresentando alguns exemplos concretos destes tipos de procedimentos exemplificados com alguns aparelhos construídos pelos autores deste trabalho. A primeira dessas tendências corresponde à montagem de reconstruções fiéis aos instrumentos originais nos mínimos detalhes possíveis; a segunda tendência incorpora alguns elementos simplificadores em suas reconstruções históricas, acrescidos de um caráter problematizador das atividades pedagógicas desenvolvidas. Um terceiro tipo de alternativa, idealizada pelos autores deste artigo, consiste na utilização igualmente problematizadora de instrumentos híbridos construídos como sínteses de outros aparelhos históricos analisados. Um exemplo desta alternativa é apresentado e ilustrado com um aparato especialmente construído com tal finalidade.

As Reconstruções Históricas e o seu Fundamento Filosófico-Educacional
As reconstruções históricas têm constituído, nos últimos anos, uma forte corrente dentre os trabalhos que tratam da utilização da história da ciência no ensino das ciências (Brower & Singh, 1983; Chew, 1986; Gainer, 1981; Decker & Kipnis, 1997; Teichmann, 1999; para citar apenas alguns trabalhos). Apesar desta tradição de pesquisa já bem estabelecida, é comum, entretanto, que alguns iniciantes em atividades de investigação em Educação em Ciências, e por vezes nem tão iniciantes assim, associem, sem muito rigor, trabalhos envolvendo experimentos e instrumentos de laboratório com posturas empiristas na Educação. Tal associação é gratuita e muitas vezes sem qualquer fundamento a não ser um preconceito movido por uma certa fragilidade teórica no tocante a uma análise mais cuidadosa da relação teoria-experimento. Com efeito, o simples fato de alguém admitir, por exemplo, que a Física seja uma ciência experimental não carrega em si, necessariamente, a conotação de empirismo. Uma postura empirista, de forma mais precisa, está em verdade relacionada com a concepção de que as idéias científicas originam-se diretamente das observações, sem qualquer tipo de mediação por parte do observador. Em outras palavras: para o empirista as observações científicas são desprovidas de toda e qualquer carga teórica (Medeiros & Bezerra Filho, 2000). Admitir-se, portanto, que toda observação já traz em si mesma um certo recorte na realidade, recorte este propiciado pelo modo peculiar como o observador encara o fenômeno, já garante, de saída, que as observações não estejam sendo interpretadas de um modo tão ingênuo quanto aquele que costumeiramente os empiristas costumam atribuir às mesmas. Por outro lado, há de se considerar, também, em uma segunda acepção, que um experimento não é um simples contato direto com a realidade, que todo experimento equivale a uma tentativa de obter, na prática, resultados que possam aproximar aqueles previstos para casos ideais. Neste sentido, é fundamental que se perceba que a ciência trabalha com metáforas a respeito do real, com modelos, com construções mentais idealizadas que simplificam a complexidade da natureza. Somente desta maneira, apenas de posse de tais modelizações do real concreto em direção à construção de um real pensado da Ciência, é que podemos matematizar a natureza. Da forma bruta como a natureza se nos apresenta em todas as suas múltiplas complexidades, não há, efetivamente, como proceder uma tal matematização. O primeiro passo, absolutamente necessário e essencial, para matematizar a descrição da natureza é simplificar este real concreto. Sem uma tal simplificação a-priori, sem este recorte epistemológico inicial, não há como utilizar a Matemática na descrição do real (Matthews, 1990).
Diante desta complexidade da relação teoria-experimento, na qual os experimentos podem ser vistos como tentativas de atribuir graus de realidade às idealizações teóricas, de proceder objetificações de uma realidade idealizada, abre-se um vasto campo interpretativo. O significado a ser atribuído a uma observação, ao resultado de um determinado experimento, não é algo neutro, mas depende substancialmente do referencial teórico a partir do qual as coisas estejam sendo contempladas.
A questão filosófica, acima delineada, abre uma perspectiva para que seja repensado o próprio papel dos experimentos no desenvolvimento da ciência e em especial na Educação na Ciência.
Tomemos um simples exemplo, para que a questão fique posta de um modo mais claro. Os livros didáticos de Física costumam referir-se aos fenômenos da difração e da interferência como exemplos que corroboram a natureza ondulatória da luz ao mesmo tempo em que, por conseqüência, depõem contra a teoria corpuscular da luz. Experimentos feitos por estudantes sobre tais fenômenos, pretensamente, poderiam tornar patente uma tal característica ondulatória da luz. Este lugar comum, porém, parece ignorar a história da Física, pois por todo o século XVIII esses fenômenos foram considerados como fortes argumentos contra a teoria ondulatória da luz (Kipnis, 1999).
Experimentos com osciloscópios, por seu turno, nos quais são analisadas curvas de som, são tidos hoje como exemplos patentes na natureza ondulatória do som. As curvas obtidas para sons complexos são vistas, atualmente, a partir e um referencial teórico no qual o som é visto como descrito por ondas que se compõem de modo tal a produzir uma onda complexa que pode ser descrita segundo uma análise de Fourier. No século XVIII, entretanto, a própria descrição do som enquanto uma função de onda foi alvo de uma intensa polêmica entre Euler, Bernoulli e D’Alembert (Monteiro Júnior & Medeiros, 1999a; Monteiro Júnior & Medeiros, 1999b).
Também a história da pilha voltaica serve de excelente exemplo sobre o papel polêmico da interpretação dos experimentos naquilo que eles, porventura, possam significar a respeito do comportamento da natureza. O intenso debate ocorrido entre Galvani e Volta a respeito das interpretações a serem conferidas aos experimentos da agitação das pernas de uma rã ao serem tocadas por diferentes metais ilustra bem as múltiplas possibilidades de atribuição de significados que podem ser conferidas aos resultados experimentais (Kipnis, 1999).
De um modo geral, as disputas interpretativas, produtos de diferentes análises e sínteses de dados coletados constituem-se em características essenciais do desenvolvimento da Ciência. Conhecer tais disputas e, acima de tudo, poder inserir-se nas mesmas, ainda que de um modo simplificado, pode ser um ótimo exercício educacional para a compreensão da natureza da Ciência (Crenshaw, 1979).
Esta tônica preside a preocupação manifesta por muitos dos que têm dedicado-se à reconstrução de experimentos históricos. Longe, portanto, do sonho empirista de reproduzir algum experimento mágico que tivesse, por si só, o condão de revelar a verdade da natureza, a corrente dos que têm enveredado pelo terreno das reconstruções históricas está pautado, sobretudo, por fortes preocupações filosóficas (Freundlich, 1980, Heering, 1999, Kipnis, 1999).

Tendências Metodológicas no Uso das Reconstruções Históricas como um Recurso Pedagógico
Uma primeira corrente na direção das reconstruções experimentais é aquela representada pelos trabalhos do grupo de Oldenburg. Sua tentativa tem sido a de reproduzir fielmente os detalhes dos aparelhos envolvidos nos experimentos, assim como a de produzir textos que dêem conta da atmosfera cultural da época em causa. Apesar dos relativos sucessos obtidos, do ponto de vista educacional, a proposta de Oldenburg é de execução extremamente complexa. Para começar, a tentativa de reprodução fiel dos aparelhos utilizados esbarra, por vezes, em enormes dificuldades a serem contornadas. De outra parte, a tentativa de reproduzir o contexto teórico e cultural de disputas que dêem conta de toda aquela complexidade contida nos instrumentais utilizados envolve uma dificuldade intrínseca que não é, igualmente, de ser subestimada (Heering, 1999).
Uma segunda corrente dentro desta tendência de reconstruções experimentais é aquela desenvolvida pelo grupo de Minnesota, mais especificamente o grupo da Bakken Libray and Science Museum liderado por Nahum Kipnis. Para esta segunda corrente, o que estaria em jogo seriam os princípios fundamentais dos conteúdos a serem discutidos. Deste modo, as reproduções históricas desenvolvidas por este grupo não têm se prendido aos detalhes técnicos constitutivos dos aparelhos utilizados. Tenta-se, assim, preservar a essência dos fenômenos estudados sem deter-se em dificuldades tidas como de segunda ordem. Com uma tal simplificação da aparelhagem, com a substituição de alguns materiais, por exemplo, obtêm-se, igualmente uma maior agilidade naquilo a ser discutido nos textos teóricos que acompanham a proposta (Kipnis, 1999).
Na nossa própria experiência educacional, esses dois tipos de abordagens foram explorados, com alguns relativos sucessos e muitos percalços, ao longo de vários anos de ensino na Universidade. Deste modo, desenvolvemos abordagens compatíveis com algumas reconstruções experimentais rigorosas, como aquelas do grupo de Oldenburg. Neste campo situamos montagens como a do duplo cone de George Adams (século XVIII) e as disputas interpretativas sobre o aparente paradoxo de um corpo sólido que aparenta subir ladeiras. Uma tal discussão, que tenta reproduzir aquelas pioneiras disputas ocorridas nas célebres conferências públicas do mestre inglês, levou-nos, por exemplo, a colocar em perspectiva as questões relacionadas com o movimento do centro de massa de um corpo. De modo análogo, reproduzimos fielmente a luneta de Galileu, incluindo aí certas imperfeições no polimento das lentes. Também as muitas e diferentes reconstruções de garrafa de Leyden são um exemplo vivo deste nosso tipo de percurso dentro da corrente originalmente definida pelo grupo de Oldenburg.
No tocante aos experimentos simplificados, semelhantes aos realizados pelo grupo de Minnesota, nossa experiência foi um pouco mais ampla, até mesmo pelas facilidades operacionais que uma tal abordagem oferecia-nos, comparativamente com a primeira. Para discutirmos os problemas ligados às tentativas históricas bem sucedidas de elevação de tensão, optamos por reproduzir uma bobina de Rumkorff e discutir os problemas físicos e as interpretações a ela inerentes. Entretanto, como se tratava de um instrumento bem mais complexo do que aqueles descritos anteriormente, decidimos fazer algumas modificações que, preservando a essência do seu funcionamento, introduzissem consideráveis elementos de simplificação construtiva e de melhoria da sua performance. Assim sendo, utilizamos, por exemplo, na confecção da base do instrumento um material resistente, isolante e simultaneamente transparente, portanto bem melhor que a madeira originalmente utilizada: o acrílico, material não disponível na época em que um tal instrumento foi concebido. Tentando, também, reduzir as dimensões do aparelho, sem sacrificar suas características de desempenho, introduzimos um capacitor auxiliar.
No tocante às garrafas de Leyden, por exemplo, nesta segunda abordagem, introduzimos um sem número de modificações constitutivas que nos auxiliaram a criar situações mais propícias ao levantamento de situações-problema em sala de aula. Como um exemplo, utilizamos garrafas de várias alturas, com armações as mais variadas, como algumas propositadamente próximas do borne superior e que assim facilitassem as descargas e complicassem a acumulação de cargas. Todas essas modificações propiciaram situações de disputas interpretativas que ensejaram importantes comparações históricas.
Um terceiro tipo de abordagem foi, também, originalmente desenvolvido por nós: o estudo de uma certa quantidade de instrumentos referentes a uma determinada temática, seguida de uma análise dos seus elementos constitutivos principais. A esta análise, feita com os estudantes em sala de aula, seguiram-se várias tentativas de sínteses daqueles elementos identificados e tidos como principais nos funcionamentos dos instrumentos estudados. A nossa intenção era criar um outro instrumento híbrido que reunisse as características principais daqueles discutidos e que contivesse certas vantagens na ilustração pedagógica dos princípios físicos discutidos. Um exemplo, para nós importante nesse caminho, foi o estudo da história dos mecanismos de registro do som, da análise dos principais instrumentos envolvidos em tal história e da síntese e construção de novo instrumento híbrido que melhor ilustrasse a natureza ondulatória do som. Detalhes deste nosso trabalho sobre os mecanismos de registro do som podem ser encontrados em Monteiro Jr & Medeiros (2001).

Conclusões
Diante das nossas experiências, no decurso dos últimos anos, no campo das reconstruções históricas, somos levados a concluir algumas questões que nos aparecem importantes, do ponto de vista educacional.
A primeira, é que qualquer que seja a modalidade de reconstrução histórica adotada, ela não deverá, jamais, limitar-se apenas à montagem e à exibição em sala de aula de um determinado aparelho; considerações de natureza teórica são igualmente fundamentais. A segunda, é que não basta que sejam fornecidas apenas explicações físicas sobre o funcionamento do aparelho em causa, se desejarmos introduzir a dimensão da natureza da Ciência na sala de aula. Precisaremos, neste caso, de certo modo, reconstituir também um clima das disputas interpretativas sobre os fenômenos tratados.
Igualmente importante, parece-nos, que se considere a questão da introdução de informações históricas que municiem as necessárias comparações com o debate travado em sala de aula. A introdução dessas informações históricas pode ser feita, por exemplo, como faz o grupo de Minnesota, logo no início da apresentação de um novo tema. Em nossa experiência, entretanto, esse não nos pareceu o melhor caminho, pois um conhecimento antecipado das posições em disputa pareceu-nos influenciar os estudantes nas suas próprias discussões travadas em sala de aula. A abordagem que nos pareceu mais conseqüente foi a da inserção de informações históricas em meio ao debate de sala de aula, como um contraponto às discussões travadas pelos próprios estudantes. Esse tipo de inserção da história fez com que os nossos alunos se sentissem partícipes da história ao encontrarem inesperadas semelhanças das suas próprias opiniões com algumas posições historicamente surgidas ao longo do desenvolvimento histórico da Física. Esta alternativa pareceu, ainda, bem mais vantajosa que a inserção de dados históricos posteriormente ao debate das questões físicas pertinentes. Neste caso, quando as informações eram feitas a posteriori, muitos estudantes pareciam, simplesmente, não demonstrar o menor interesse pelo seu conhecimento.
De um modo geral, a opção pedagógica pelas reconstruções históricas e pelas suas conseqüentes problematizações em sala de aula, é uma tarefa árdua e ainda em aberto, apesar de conseqüente e promissora. Ela mostra-se como um desafio para todos aqueles professores empenhados em trazer para o ensino da Ciência um pouco mais da dimensão histórica da pesquisa com todas as excitações e percalços que caracterizaram um tal caminhar.
Referências Bibliográficas
BROUWER, W. & SINGH, A. The Historical Approach to Science Teaching. The Physics Teacher. Vol.21, n4, 1983.
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Acessado em 2 de março de 1999.
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